18 março 2006

PASOLINI CONTINUAÇÃO

SALÓ OU OS 120 DIAS DE SODOMA E GOMORRA

1969 é um ano de muito trabalho na vida do cineasta, faz um pequeno documentário APPUNTI PER UN FILM SU'LL INDIA, colabora no argumento de AMMORE E RABBIA. Este é mais um filme com diferentes sequências, um método muito popular na Itália e muito usado no neo-realismo. Pasolini assina o episódio LA SEQUENZA DEL FIORE DI CARTA, os outros são os companheiros da praxe: Bellochio, Bertolucci, Godard e Carlo Lizzani. Ainda em 1969 faz PORCILE, mais um filme estranho dividido em duas histórias: Na primeira um jovem canibal, que havia matado o próprio pai, é condenado à morte, a setença dita que seja despedaçado por animais selvagens. Na segunda dá mais um exemplo da sua rebeldia; Um jovem, filho de um indústrial alemão do pós-guerra, decide passar a dormir com porcos porque já não consegue suportar o relacionamento com outros seres humanos. Neste ano de grande actividade tem ainda tempo de escrever uma adaptação da peça MEDEA do grego Euripedes para passá-la para a tela. No papel de Medea está uma excelente Maria Callas. A história é conhecida, narra as aventuras de Jasão que partiu com os seus companheiros no Argo em busca do Tosão de Ouro. Em 1970 começa a filmar um dos seus filmes mais famosos DECAMERON, uma adaptação de nove histórias da obra homónima de Bocacio e que foi premiada com um Urso de Prata no Festival de Berlim. É com DECAMERON que inícia a sua "Trilogia da Vida", que tem o segundo episódio em I RACONTI DI CANTERBURY. O filme segue um grupo de peregrinos a caminho de Canterbury que, para matar o tempo da viagem, contam histórias uns aos outros: No Conto do Comerciante, o velho Sir January perde a vista pouco tempo depois de ter casado com a jovem May. Esta aproveita-se da cegueira do marido para arranjar um caso com o belo Damian; mas os deuses devolvem a visão a Sir January a tempo de este apanhar os dois amantes.No Conto do Moeiro, um astuto estudante garante que vem aí o segundo dilúvio, com o objectivo de distrair um crédulo marido, enquanto faz amor com a sua mulher. Esta situação sofre uma reviravolta quando dois jovens rivais interessados no amor da mulher, ferem o orgulho do estudante. No Conto do Frade, o Demónio apodera-se da alma de um convocador que passa o tempo a apanhar as pessoas em flagrante, quando mantêm relações sexuais, para depois as chantagear. O Conto do Cozinheiro relata a história de Peterkin, um jovem diabrete cujo terrível sentido de diversão faz com que esteja sempre a ser despedido de todos os empregos que arranja.No Conto do Perdoador, três intrujões que partem à procura da Morte descobrem um tesouro debaixo de uma árvore. Em vez de o dividirem, cada um deles pensa na melhor forma de eliminar os outros dois, acabando todos por encontrar, de facto, a morte. Enquanto os peregrinos vivem as suas aventuras através das histórias que contam o poeta Geoffrey Chaucer (interpretado pelo próprio cineasta) é visto a transcrevê-los para a posteridade, o filme é baseado na obra do escritor. Foi Urso de Ouro no Festival de Berlim. Para encerrar a trilogia Pasolini vai de novo pegar numa obra de contos desta vez sãos os famosos Contos das 1001 Noites que vão inspirar o seguinte filme da trilogia. OS CONTOS DAS MIL E UMA NOITES é uma das obras mais ousadas do cineasta: Muito sexo, nudez quase explícita e a homossexualidade, quase a raiar a pedofilia, são temas muito presentes no filme. Durante a década de 70 tornou os seus filmes mais ousados sexualmente, explorando mesmo alguns tabus sexuais como a homossexualidade por exemplo. Outro tema constante na sua obra é a religião, as suas críticas à religião são por vezes muito duras o que lhe valeu muitos ódios da direita e extrema-direita italiana. Óbviamente que a crítica política não é esquecida, Pasolini viveu durante a juventude os terrorres do fascismo, viu a Itália entrar na guerra do lado dos alemães, com o fim da guerra viu também a Itália a tentar fugir do fascismo, mas este continou sempre a assombrar o país, infelizmente Mussolini, na figura da sua neta ainda hoje ameaça o país. A nova vida burguesa do pós-guerra é constantemente citada nos seus filmes, há sempre um velho, rico cheio de defeitos e pronto para todas as más acções. Nenhum filme do cineasta retrata isto tão bem no seu derradeiro filme.
Os traumas sexuais, a luta contra o moralismo hipócrita tudo isto é patente na sua última obra SALÓ OU OS 120 DIAS DE SODOMA E GOMORRA. Levemente inspirado na obra do Marquês de Sade, a acção tem lugar no norte da Itália em 1944, uma região ainda sobre o controle dos alemães. Quatro dignatários fascistas raptam 16 jovens, exemplares perfeitos de beleza e juventude. Os jovens são encerrados num castelo e vão servir para os seus raptores explorarem as piores depravações sexuais. Sexo, sadomasoquismo e muita depravação fazem deste filme um dos mais insanos da carreira de Pasolini.
Na manhã de 2 de novembro de 1975 uma senhora descobre o corpo do cineasta na praia de Ostia. Um jovem delinquente, aparentemente amante de Pasolini, é dado como culpado. Giuseppe Pelosi assume o crime, foi julgado e condenado. No entanto a sua culpa nunca foi provada, até hoje discute-se qual o móbil do crime, política, sexo, roubo; seria Pelosi o verdadeiro assassino ou foi apenas um bode expiatório, penso que nunca o saberemos.

A obra completa do cineasta vai estar em exibição na Cinemateca Nacional, para quem não a conhecer é uma óptima oportunidade. Eu conheço bastante bem a obra dele graças ao canal 2 da RTP, a maior parte dos seus filmes já passou por lá, alguns como OS 120 DIAS DE SODOMA E GOMORRA ou OS CONTOS DAS 1001 NOITES são presenças recorrentes naquela estação de televisão.

1 comentário:

Anónimo disse...

Feliz Equinócio da Primavera!